Se existe local de uma beleza surreal, repleto de misticismo, de semblante enigmático é sem qualquer hesitação, Sintra. E julgo mesmo que o mais impressionante e majestoso monumento é a própria serra, em cujos recantos tentadoramente bucólicos se aninham as casas de Verão de alguns privilegiados da capital.
A magnífica vila de Sintra é toda ela mágica e cheia de esplendor – um reino romântico onde palácios majestosos, um castelo de contos de fadas, propriedades régias e mansões fascinantes emergem no meio de montes e florestas luxuriantes.
Caracterizada pelo seu encanto e serenidade singulares, a vila de Sintra oferece cenários de uma beleza surpreendente, com a sua vasta serra rochosa, densa vegetação e praias imaculadas.
Sintra é por si só um local de encantamento, de história, e de tão insondável, uma invulgar zona de fantasias e lendas.
Sempre que percorro os trilhos que serpenteiam pela serra, a minha imaginação, solta asas e vagueia nos céus azuis da fantasia.
Descia a estrada de Monserrate. Existem momentos e locais onde o tempo é intemporal, este é um deles. Os muros são cobertos de verde desde que mundo é mundo. O silêncio reina. A água corre ao nosso lado, pelos regatos, nas fontes, nas pequenas bacias e lagos que bebem o legado das encostas. Poderíamos ser personagens de um qualquer livro, numa qualquer época, que as palavras fluiriam naquele mesmo leito natural, de uma pureza transparente e imortal.
Continuei a destrepar a estrada afastando-me da vila. Após caminhar alguns quilómetros, deparei com uma porta improvisada com tabuas de madeira completamente escancarada. Com alguma dificuldade apercebi-me tratar-se duma pequena taberna isolada na planície árida, a várias léguas dos povoados mais próximos. Sentia-se que era o meio caminho de estranhos viandantes de proveniência obscura, tão obscura quanto o seu rumo, que os levava a passar ali e a parar para uma pinta de cerveja ou uma malga de vinho a regar um naco de pão com presunto.
Traziam sempre nos olhos o brilho fantasmagórico de quem andasse pela beira dos abismos mais negros, e contavam histórias incongruentes de miragens e assombrações que confundiam os caminhos na vastidão da planície, que tinha fama de lugar sinistro. Alguns demoravam-se um dia ou dois, recobrando forças num dos pequenos quartos do primeiro andar, toscos mas limpos. Porém, as noites não eram tranquilas. À hora rubra do sol-pôr levantava-se uma inesperada ventania que assobiava à volta da casa isolada, fazendo bater as telhas e estalar as portadas grossas. De apaziguador, havia apenas a mulher do taberneiro. Era um mistério aquela criatura graciosa e plácida que ajeitava o avental com os modos delicados com que tocaria o mais rico dos tecidos, e não havia memória de quando, como ou por que razão fora ela ali parar, casada com um homem tão grosseiro e brutal.
As horas cavalgaram por montes e vales sempre a trote. Traguei a noite ao mesmo ritmo que ia deitando abaixo algumas cervejas. Há uma brisa fria que obriga aos casacos. Depois de estender o olhar uma última vez sobre o balcão, os olhos do taberneiro dizem-me que é hora de voltar a casa.
Despedi-me da cerveja, e disse adeus a Sintra.
Já no apartamento desarrumado onde cheguei sem dar por mim, ainda havia uma réstia de calor. Nas colunas da sala ecoavam as notas rápidas e medievais da banda sonora do filme “Excalibur” de Trevor Jones. Havia um copo vazio e um cinzeiro cheio.
Passou-se tanto tempo que pareço não saber o que aconteceu e o que apenas foi imaginação na minha cabeça: às vezes parece que não houve passado nem ficção, que a distinção nem sentido faz.
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No tempo em que os Mouros dominavam Sintra, os cristãos faziam frequentes incursões contra eles, chegando por vezes muito próximo do castelo.
Um dia chegou um cavaleiro verdadeiramente extraordinário. Tinha no olhar o fogo da inquietude interior, à qual nenhuma assombração poderia sobrepor-se assim como qualquer aparição padeceria de invisibilidade, pois aqueles olhos estavam obstinadamente voltados para dentro. Também a grosseria do estalajadeiro e a suavidade da sua tão bela mulher lhe passaram despercebidos.
Num desses recontros travou-se junto do castelo uma renhida batalha. Mas os cristãos foram vencidos porque o seu chefe - o nobre cavaleiro - havia tombado ferido e logo fora aprisionado pelos infiéis.
Conduzido ao castelo, encerraram o nobre cavaleiro ferido num húmido calabouço com cadeias nos pés e nas mãos.
O intuito era deixá-lo para ali abandonado, sem alimento nem tratamento até que a morte o levasse.
Porém, ao atravessar o pátio para as masmorras, foi visto pela filha do alcaide, que estacou petrificada, tal a impressão que o jovem cavaleiro lhe causara. A todo o custo a jovem donzela tentou saber onde o cavaleiro estava encarcerado. E pela calada da noite, com o auxílio de uma das suas aias, foi visitar o prisioneiro.
O silêncio e a escuridão reinavam na masmorra acanhada onde o cavaleiro português estava trancado. Cautelosamente, a jovem moura abriu o portão de grades e entrou. Deu apenas dois passos. A escuridão era intensa. Ouvia a respiração agitada do prisioneiro. Com a conivência da aia, acendeu um pavio, e a fraca luz iluminou defeituosamente o triste cubículo. Mas o cavaleiro português distinguiu perfeitamente o lindo rosto da jovem moura. Perplexo pela visita, o cavaleiro inquiriu:
- Que quereis, donzela?
Ela respondeu, com aparente serenidade:
- Curar as tuas feridas e trazer-te de comer.
- Quem vos mandou?
- A minha consciência.
- E se vos virem?
- Espero que não.
- Quem sois?
- Zaida, a filha do alcaide.
Docilmente, o cavaleiro cristão deixou-se tratar pela bondosa e linda sarracena. Quando terminou, ela disse-lhe como despedida:
- Até amanhã meu nobre cavaleiro.
Dia após dia, Zaida não faltava ao prometido encontro. Com grande espanto dos mouros, as feridas do cavaleiro começaram a sarar.
Igualmente várias tentativas eram feitas no intuito de ser conseguido um resgate pelo importante prisioneiro. Por esse motivo, os mouros começaram a dar-lhe de comer.
Numa noite após o cavaleiro estar convalescido, Zaida entrou na masmorra.
Com a voz trémula e emocionada disse-lhe sem tirar os olhos do chão de terra barrenta:
- Venho dizer-vos adeus.
Ele tomou-lhe uma das mãos com arrebatamento:
- Zaida! Porque dizeis isso?
- A vossa família e o vosso rei ofereceram um grande resgate. Ireis sair amanhã, mal o sol rompa. E sei que não mais vos verei!
Ele atraiu-a a si.
- Zaida! Vinde comigo!
Ela esquivou-se.
- Não posso. Seria uma traição que a minha consciência não aprovaria.
- Mas eu amo-vos, Zaida! Amo-vos mais do que à minha vida!
- Também eu vos amo, nobre cavaleiro mas tudo nos separa.
- Zaida! Vou ficar!
Ela meneou a cabeça.
- Não sejais um homem tão louco. Não podereis ficar. Os meus querem o resgate e os vossos anseiam por vos reaver.
- Voltarei!
- Sereis provavelmente de novo ferido, ou talvez morto!
- E se vencer?
- Talvez seja eu quem deixe de existir!
O cavaleiro cerrou os punhos em completo desespero.
- Juro-vos linda donzela que sem vós não poderei viver!
- Nem eu!
- Então... Porque não vindes comigo?
- Poderei dar a vida por vós, mas não a honra. Também de vós não quero mais. Sois nobre e valente! Não peço que me esqueceis! Desejo mesmo que nunca mais a minha imagem e a minha voz saiam dos vossos olhos e ouvidos. Contudo... Sou eu que vos digo: Ide... E não regresseis!
O cavaleiro cingiu a linda moura com enlevo. Beijou-a nos cabelos, na testa, nos olhos. Ela voltou a esquivar-se. Chorava em silêncio. E murmurou, afastando-se:
- Adeus, meu único amor!
E, em passo célere desapareceu na desalumiada da noite. Apanhou rapidamente um ramo de alecrim, que pôs num pote sobre o parapeito da janela, para que o vento ao passar entre as frestas de madeira tosca trouxesse consigo a presença de um aroma acolhedor; colocou mais um cobertor na cama e deixou o seu pequeno livro, o seu tesouro, junto do jarro de água fresca. Mas não bastava. Não bastava. A abalada do cavaleiro assim que o sol espertasse, fê-la sentir desolada e perdida, o que lhe provocou, grossas lágrimas, quentes. Quase sem dar por isso, despiu-se e soltou os cabelos. Foi até à cama, abriu-a, e ali deu largas ao seu estranho desgosto, feito de espanto e desejo. Procurou-se. Descobriu-se, percebeu como era linda e triste, como tinha a força imensa feita da fragilidade que não quebra jamais. Despojada, vazia de tudo quanto lhe era familiar, mas plena de uma coisa nova que lhe ficara tão fundo e não sabia ainda como nomear, abandonou o quarto, deixando a cama meia desfeita cheia das suas lágrimas, dos seus odores, dos seus cabelos. Ninguém mais a viu nessa noite.
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Novamente no meio dos seus amigos, familiares e companheiros, o cavaleiro português foi recebido com grandes demonstrações de alegria. A sua libertação foi celebrada com grandes festas. Mas, apesar dessa exuberância de carinhos, o cavaleiro sentia uma tristeza infinita. Voltou às armas. Dir-se-ia ávido de novas conquistas. E as suas expedições eram sempre contra os Mouros. Queria aturdir-se. Queria esquecer Zaida. Mas a sua imagem e a sua voz - tal como ela havia desejado - continuavam na sua retina e nos seus ouvidos, mesmo no mais aceso das batalhas.
Desesperado, depois de contínuas noites de insónia, fazendo do seu segredo uma força secreta, resolveu atacar de novo os mouros de Sintra, desafiando-os para novo encontro. O seu intento era assaltar o castelo - ou morrer! Reuniu maior número de combatentes e entusiasmou-os a tentarem fazer essa oferta ao seu rei e senhor. Todos os seus companheiros se mostraram dispostos a segui-lo e rapidamente se ultimaram os preparativos.
De surpresa, os cristãos subiram a serra de Sintra. Era noite. Uma noite tórrida de Verão.
Tentaram assaltar o castelo. Mas os sarracenos, verificando o reduzido número de combatentes cristãos, saíram ao seu encontro, dando-se novo combate corpo a corpo. O ardor posto na luta por parte dos cristãos era tanto que lograram entrar no castelo, fazendo-o cair em seu poder.
Mas logo em seguida os soldados portugueses foram acometidos de enorme e dolorosa surpresa. O seu chefe (o nobre e valente cavaleiro) procurava a formosa moura filha do alcaide e ambos haviam caído nos braços um do outro. Entregues à embriaguez desse momento de encontro, o cavaleiro e a jovem pareciam esquecidos de tudo o mais.
Os lábios colaram-se num beijo infinito. Um misto de dor e prazer percorreu-lhes o corpo.
Então os mouros começaram a reagir e os cristãos, privados do seu chefe, em breve se sentiram rodeados de perigos. Os mouros haviam conseguido reforços. Da atalaia divisava-se uma fila enorme de tropas sarracenas que vinham juntar-se às do castelo. Os cristãos ficaram cercados. Só então o cavaleiro enamorado se deu conta da gravidade da situação. Soaram trombetas. Levantou-se a ponte levadiça. Organizou-se o combate. Havia quase dois dias que ali estavam os cristãos esperando as ordens de D. Afonso Henriques, a quem haviam mandado um mensageiro. Mas a mensagem enviada ao rei cristão já não correspondia à verdade. A causa estava praticamente perdida. O chefe cristão separou-se da jovem moura, vestiu de novo a cota de malha, e travou-se o combate, heróico de parte a parte. Por fim, depois de uma encarniçada luta na qual pereceram muitos chefes cristãos, o cavaleiro chefe também caiu ferido.
Ao vê-lo caído por terra e coberto de sangue, Zaida ficou como louca. Tratou de arrastar do pátio o seu bem-amado e de escondê-lo num dos corredores. Aí, com esforço inaudito, e depois de verificar que não a estavam espiando, abriu uma lousa. Uma entrada subterrânea ficou a descoberto. Com mil dificuldades, entrou pela abertura, levando consigo o ferido, que havia desmaiado. Fechou a lousa atrás de si. Depois, quase sem luz e continuando a arrastar a sua preciosa carga, foi percorrendo galerias subterrâneas até chegar a uma sala preparada numa cova, que recebia luz indirectamente.
Nessa sala havia uma saída que ficava fora do castelo e já quase a meio da serra. Colocando o ferido num divã coberto de tecido precioso, Zaida pegou numa bilha e procurou a saída. Perto havia uma nascente. A moura sabia da sua existência. Encheu o cântaro de água e voltou a tratar do ferido, tal como fizera meses antes. O cavaleiro abriu os olhos. Recobrou o alento e ficou estupefacto quando soube onde estava. Quis saber dos seus companheiros. Ela beijou-o ternamente, dizendo-lhe:
- Que importa o acontece aos outros? Estamos aqui os dois. Não vos basta?
Ele meneou a cabeça, demonstrando o seu sofrimento.
- Não, não me basta! Fui eu quem os atraí a este combate para o que não estávamos ainda preparados. Só pensei em mim. Não podia a continuar a viver sem vos! Mas vejo agora que não devo viver à custa das suas vidas!
Com fala dolorosa, ela perguntou:
- Mas que pensais fazer?
- Juntar-me aos meus companheiros!
- Foram desbaratados, não penseis mais neles! Pensai antes em vos, que não tenho a certeza de poder salvar!
Ele fechou os olhos. Sofria. Moral e fisicamente. No dia seguinte, mais fraco ainda, pediu:
- Dá-me de beber...Tenho secura! Arranha-me a garganta.
Ela observou:
- Amor meu, eu tenho de ir buscar mais água. Esta acabou-se. Mas volto já!
Ele segurou-lhe numa das mãos:
- Não...Deixa-te ficar... aqui... Ao pé de mim...
Ela beijou-lhe a testa escaldante.
- Não demorarei. Prometo que não demorarei...
Saiu. A algazarra havia terminado. Dir-se-ia que a batalha chegara ao fim. Zaida encheu célere a moringa e encetou a caminhada para a sala subterrânea. Porém, quando estava já próximo da entrada, uma seta vinda do lado do castelo acertou-lhe em cheio. Caiu de joelhos agarrada ao cântaro da água que verteu metade. Teve forças, porém, para se arrastar até ao local onde o mato tapava a entrada. Rastejando e perdendo sangue, Zaida só caiu junto do seu cavaleiro. A bilha caiu também e a água perdeu-se. Zaida havia desaparecido do mundo dos vivos.
Desesperado, o nobre soergueu-se do leito e veio ajoelhar-se junto da sua bem-amada. Suplicou:
- Ó Deus Misericordioso! Perdoai-nos os pecados que cometemos neste mundo... E juntai-nos... De novo... No Céu!
Com o esforço feito, a ferida do cavaleiro voltou a abrir e o sangue cristão do jovem misturou-se com o sangue mouro da linda Zaida. E esse sangue só parou de correr quando ambos pareciam já duas estátuas de mármore.
No castelo, os mouros haviam mais uma vez repelido o ataque dos cristãos. Procuravam Zaida e o ferido por toda a parte. Foi então que um soldado descobriu o rasto de sangue deixado pela filha do alcaide. Seguindo-o, foi encontrar os corpos sem vida do cavaleiro cristão e da jovem moura, lado a lado, numa larga cova distante do castelo.
Desde então, diz a lenda que, em certas noites de luar, quem tenha a ousadia de vaguear pela Serra de Sintra verá sair de uma larga cova, junto a um penedo, uma formosíssima donzela vestida de branco, com uma bilha na mão. Com passos apressados, a jovem de branco dirige-se para uma nascente de águas finas. Depois, regressa à mesma cova donde saíra, com o pequeno cântaro já cheio. A meio do caminho solta um doloroso gemido. Depois, desaparece, qual branco fantasma...
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Era uma noite semelhante às outras, talvez mais perfumada de luz e sentia-se um sabor a esperança no ar.
A serra da Arrábida afastava-se já da noite, projectando o nascer do sol e o brilho nas alvas portadas do meu quarto.
O dia ia-se revelando mais, já com a Lua e Vénus ausentes.
As janelas entreabertas da nossa memória, tal como as do nosso quarto, deixavam entrar uma intimidade que pobremente existiu. Ou por vezes aconteceu como acto isolado num passado que deixa de o ser, de cada vez que a brisa abre mais um pouco as janelas e faz espreguiçar as cortinas e o que está dentro da casa habitada da nossa memória é o mesmo que está do lado de fora à procura de voltar ao interior. Será que algum dia saíste de mim? Será que algum dia habitas-te esta casa?
A brisa espalha-se pela casa, faz-se notar, estende-se como tu cá dentro. Tem cheiro, textura, sabor.
Penso nas voltas da minha vida, nas promessas de eternidade que nunca se cumprem. Penso nas relações que se juram sólidas e ao rasgar das folhas do calendário acabam.
Penso na vida que se vai tão rápida como um suspiro. Penso nos dias que me levanto com a alma reduzida e me deito com a sensação de a ter perdido. Deixo flutuar o pensamento no bote das minhas emoções. Houve um tempo em que pensei que a minha vida ia ser especial, distinta. Ideais, valores superiores, razões para lutar. Hoje vejo-me preso na monotonia, na cor cinza, na existência com uma única razão a de lutar por mim mesmo sem grande firmeza. No fundo vivo longe do mundo submergido na deliciosa melancolia.
Abro os olhos, ergo-me… O fumo do teu cigarro já fugiu, as janelas dentro de mim batem com força! As portadas esmurram a parede. Olho para ti…
Somos os mesmos, é verdade. Mas, o vento é mais calmo, a chuva hoje é sol e o toque não é o teu… é o de uma flor.
Estou cansado de viver sozinho com alguém! Tenho saudades de te dizer o que não disse!
Mas, não se pede a ninguém que não parta e não se pede a ninguém que volte. Quanto muito, espera-se e ainda assim é alma que se consome. Não tenho existência suficiente para ocupar este espaço todo onde tu faltas. Dirijo-me à janela para olhar o céu. Está frio, mas o sol brilha intensamente.
Percebo que é exactamente assim que me sinto. Apesar de viver numa sociedade fria e desumana, a esperança num futuro melhor aquece-me o coração. Sou mesmo um sonhador!
Observo a silhueta de uma jovem de vestido branco, que aldeaga com os olhos colados ao asfalto. Medito na lenda que ouvira na taberna.
Tu fazes-me imaginar a jovem donzela da cova encantada, do amor místico que só a morte consegue unir.
E, nos dias em que estou assim, prenhe de aflições, torneio a minha mão em volta do calor do teu corpo apartado enquanto tu te diriges com passos apressados, para a nascente de águas finas, onde viste correr as lágrimas que banharam o nosso amor. Depois, regressas à mesma cova donde saíste, com a sacrílega perfeição, mas sabendo que foi o meu corpo aquele que aceitaste.
A meio do caminho soltas um doloroso gemido. Depois, desapareces, qual branco fantasma...
(Texto baseado na lenda da Cova Encantada)
Autor: Do domínio popular
Fonte: Biblioteca de Sintra