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sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Puta sem nome


“Amar alguém que não possuímos ou amar um ser que perdemos é preservar na alma um segredo infinito, uma dor imensurável que só a nossa morte nos desvenda e tranquiliza!”

JC




Foi parida e engendrada num lago enlameado de ilusões e desde cedo que beijou a fome e afagou o desanimo.

Ela é bonita sem ser uma mulher pulcra na sua integridade. Possui uns olhos rasgados que parecem flutuar com o movimento ondulante do corpo. Igualmente dona de uns lábios carnudos exala a ânsia crua e a lava incandescente que inunda de forma esbraseada qualquer coração menos atrevido.

Prostituta de rua deambula pela cidade que ferve por entre os dentes das horas tardias.

Desfila numa ‘passerele’ de asfalto, sem nome, cor, ou aplausos.

Ensaia gestos, movimentos apelativos com as ancas bem torneadas e os seios hirtos. Os lábios cor de fogo corados de batom reles emanam um misto de prazer e náusea.

As esquinas que habita são abrigos armadilhados, consumidos pela escravidão e pelo medo. São as esquinas da rua dos dias que passam.

Ao longe, numa falsa timidez, tem no olhar as primaveras que não viveu. Há no ar um perfume, um desejo ou a memória de um sonho...

Acorda todas as manhãs num vazio sem amparo, numa solidão sem nome. Doce, quase humana, olha a tarde em busca de um milagre que não acontece.

A blusa transparente ondula, a minissaia convida...

Tem uma voz fraca, doces e densos, os olhos parecem húmidos. Espera impaciente em qualquer lugar a sombra dos seus pecados. Em algum lugar, a sua boca tece, ávida, o calor húmido e doce de alguém com hálito a mortalha barata.
Em algum lugar, o seu gemido cala o som de algumas traidoras consciências.

Em algum lugar, a sua dança extasiante, confunde o espaço e o tempo estagnados numa poça enlameada da uma vida deslustrada.

Em algum lugar, amor, paixão e sexo, não terão nenhum sentido.

Em algum lugar, será o imaginário de todos nunca imaginados. Luta sem tréguas uma batalha sangrenta pela paz do amanhã.

Mas, amanhã será o ontem esmagado, o rasto dos seus passos serão meras sombras no desalinho das emoções fugazes de uma hora. Galga os dias, afugenta as horas, abraça os instantes em despedidas com um corpo prostrado, com um rosto sem expressão.

Procura as marcas da sua presença e encontra somente fantasmas em agonia.

Cansada de amanhãs nascidos mortos, caminha na solidão sem nome, sem vida.

Hoje, mais do que ontem, sabe que ninguém escutará as suas súplicas. Vive paredes meias com a morte, sem ninguém que testemunhe a sua existência... Morre em cada lágrima o desespero do tempo... Resiste mais um instante, como quem ainda espera por alguém ou por alguma coisa...

Morre dentro de si a última memória daquilo que foi vida, morre dentro de si o último lugar onde acreditou em milagres...

Indiferente, a tarde cai, igual à última tarde... Sente que a sua solidão é o seu pior carrasco...

A noite chega, escura, quase morta... Contínua só, absolutamente só... Não sabe se está louca ou lúcida... Se ébria ou sóbria, se morta ou viva. Esquece-se dela, do seu nome...

Sabe que ninguém se lembrará de quem foi... Será simplesmente a puta do bairro, a tal que não tem ninguém, a tal que chora todas as noites...

Será apenas mais uma mulher sem história... Uma puta sem nome…

O lusco-fusco tomou já conta da cidade, as cores e as faces, são apenas silhuetas anónimas, sem alma e coração.

A rua estreita fica mais povoada, sombras atravessando sombras...

Acabou de negociar as entranhas. Negou mais uma vez sentir-se amada.

 

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Saudade



"Amor não é duas pessoas de mão dada; é a vida de mão dada com a morte, a alegria de mão dada com a tristeza, o bem de mão dada com o mal"

João Fernandes in ‘Povo que lavas no Rio’


Desperto geralmente sem mim
Defronte do espelho novo contemplo uma velha lembrança
Já não me sorri... Nem sequer lacrimeja por mim
Fixo, apenas as marcas indeléveis do tempo
Já não é criança
A pulcritude de sua vivacidade está ofuscada pelas agruras passadas
Caminha taciturnamente em direcção a si mesma
Nos olhos o brilho triste, de um adeus, de uma despedida
Na boca o sorriso desfeito


Não é possível viver de memórias
O velho espelho coage-me a percorrer novos caminhos de significados
Um vazio incomensurável preenche o tom cinza dos meus dias
Dos meus encovados e bacentos olhos
É como se uma parte de mim tivesse sido enterrada sem dor, na arca do tempo
O espelho mostra e revela, o que ainda me resta
Falta-me a luz daqueles olhos que me acabrunhava
A voz que me arrancava do torpor que o tempo pariu
O toque que me queimava a pele quente de desejo
Cerro os meus olhos, cheiro o frio que me circunda, mas não me consigo sentir


Abro os olhos a medo
Já não consigo ver a cor das muralhas que me cercam o desgostoso coração
Perco-me nas partituras da música que já não faço.
São notas perdidas?
Pedaços de um sonho?
Vidas desfeitas?
A solidão enegrece os dias que me fogem célere num cavalo alado
O sangue estagna nas veias do meu corpo débil e enfermo

Tantos e intensos desejos que se perderam no atalho da felicidade




Caminhos díspares criaram um abismo que medrou dentro de dois corações
Recordo aquele entardecer frio e ardente de esperança
Hoje, aqui só e sem entender, as escolhas que fizemos, os passos que não demos
Às vezes enxugo a lágrima da despedida que não tivemos
Sei que nada é por acaso que tudo tem sempre um motivo
Sento-me no regaço da imaginação à espera de respostas que talvez nem existam
Ainda anseio por palavras que se esqueceram de mim


Além da velha imagem que vejo defronte do espelho novo
Há uma alma vagabunda que deambula em fantasia pelas ruelas estreitas do teu corpo
Um espírito que luta com o coração em chaga uma esgrima de amor sem fim
Num duelo permanente, amargurado, sem vencido ou vencedor


Agora, colecciono noites. Noites escuras, frias e tristes.
Enclausuradas em frascos da minha memória que visito invariavelmente nos dias mais tristes.
Apenas um frasco permanece vazio…
Junto noites em que oiço a chuva numa precursão ritmada sem som
Escolho uma ao acaso onde faço amor numa cama de sonhos


Deixo-me abraçar pelo frio que me invade a pele, me percorre as veias num arrepio de saudade
Oiço o silêncio do escuro e vejo o murmúrio da tua voz sempre mais distante
Apenas o latir de um cão perturba o meu choro abafado e compulsivo
Abro a janela do meu recanto de par em par
O balançar das folhas nas árvores faz-me meditar na incerteza da vida e na convicção da morte
Procuro aquele olhar penetrante e lascivo que caiava o azul do meu
Que tantas vezes disse tudo do nada que havia para dizer
O sorriso estridente que nos levava em sepulcro silêncio para um lugar mágico, só nosso
Onde não precisávamos ter receios
Éramos apenas nós mesmos, sem máscaras, sem medos
Seres inacabados na sua imperfeição que se achavam após uma longa e prolongada ausência!


O sonho ruiu, o meu, de mim, de ti, de nós. Desmoronou-se toda a magia, como se fosse de areia a desfazer-se na preamar
E eu, em que me transformei?
Em sombra, apenas uma sombra que deseja andar de mão dada com amor
Um espectro com a vida de mão dada com a morte
A alegria passou a andar de mão dada com a tristeza, o bem de mão dada com o mal.

E tu?


Cobre teu coração com um xaile negro que te aconchegue e proteja do frio e da solidão do amor


E Eu?


Eu deixo que a alma me leve sem destino para não mais ser encontrado a contar os dias que me resta





(Este texto foi inspirado nas dolorosas mas realistas palavras de João Fernandes)

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Porque murcha o girassol?


Nove e dez minutos da manhã. Valeu a pena ter fugido da cama bem cedo. A fragrância a iodo do mar faz-me sempre bem.
Entrei em casa bocejando sem parar. Doíam-me os maxilares. Sentei-me no sofá do canto e no canto do sofá. Acabrunhado. Sentia-me triste. Sei que podemos ficar desgostosos e feridos com as palavras mais cruéis. É natural!
Caminhar dias e dias numa estrada sem fim com dúvidas que nos atormentam sem limite, sem dó.
Gerar feridas abertas no nosso coração, que nos lançam para um sofrimento bárbaro. Mas, nada aniquila tanto por dentro, como uma grande desilusão.
E se esse desapontamento vem de alguém que nos ocupa um lugar no coração, é como se as árvores estivessem completamente despidas, o campo integralmente deserto, a música sem melodia, a palavras sem significado, o coração sem pinga de sangue.
Torna-se num lugar de memórias antigas, que mais não fazem do que obrigarem a lembrarmo-nos de que o nosso coração, no fundo, no fundo, só a nós pertence.
Lancei um olhar lânguido para o fundo da casa onde se encontrava a estante de pinho com livros em desaprumo. Deixei-me invadir por breves instantes num enternecimento de lágrimas inoportunas.
Por vezes não basta o que alguém nos diz. Por vezes não basta que alguém nos tente compreender. Que tente lutar... Que despeje nas nossas mãos mil palavras. Não basta tentar. Tentativas. Tentativas que não nos tocam o coração. Um gesto, um beijo ou simplesmente um abraço consegue tirar-nos os pés do chão e flutuar sem asas no espaço.
No meio da desordem dos livros, escolhi um ao acaso e mergulhei naquele mar de letras!
Após percorrer várias páginas deixei-me ficar encostado ao ponto de interrogação de um parágrafo do livro “Os íntimos” Inês Pedrosa.
Penso que nunca compreendi o verdadeiro mundo das mulheres. Por esse motivo fiquei a pensar naquilo que tinha acabado de ler.

“… Porque tem de haver uma razão para tudo? Que razão assiste ao despertar da paixão?
As mulheres exigem explicações, não suportam a natural irracionalidade da vida. Queixam-se da previsibilidade dos homens, da sua incapacidade para a surpresa – sempre os mesmos gestos, sempre o mesmo sofá, as mesmas rotinas, os mesmos restaurantes -, nunca compreendem a decadência do desejo, ou antes, o pânico da prisão. Um dia um homem acorda e sente-se preso por uma mulher amada. Isso não quer disser que tenha deixado de a amar, apenas que a ama agora de outra maneira. O sexo gasta-se. As mulheres parecem não perceber que o sexo se gasta muito depressa. Talvez sejam mais hábeis com a imaginação. Ou com a mentira. O corpo de uma mulher adapta-se à mentira, como a tudo. O corpo de um homem é verdadeiro como um hospital. Nunca mente. Por mais que queira, não mente. Não sabe.”…

O mundo será um lugar melhor no dia em que as mulheres perceberem que o romantismo não tem de ser um acto diário para ser verdadeiro!
Que entendam que existem infinitas formas de mostrar amor, romantismo, paixão e humildade.
Algumas mulheres não percebem como são lindas como os lírios do campo. Outras não atingem que quando nos olham é como uma perversa tentação, uma forma de provocação, qual efeito para a abelha que procura o pólen num enorme girassol.
Mas por vezes a escuridão que nos talha a alma ressaca campos inteiros de girassóis, que sem vida se ajoelham junto da terra, sem nenhum encanto, com as ramas pesadas de sono roçando a lama fria da terra.

O girassol, murcha e a abelha despega-se da debilitada flor e vai procurar outra, e outra…
 

quinta-feira, 1 de março de 2012

Talvez ainda te ame!



  " QUANDO O AMOR É SINCERO ELE VEM COM UM GRANDE AMIGO, E QUANDO A AMIZADE É CONCRETA ELA É CHEIA DE AMOR E CARINHO."
(Sheakespeare)

Em dias infindáveis amei-te loucamente. Durante intensos dias, amei-te mais do que a minha própria vida. Acredita que é verdadeiro o que te digo.
Hoje peço-te que aceites o que afirmo e que acredites nas minhas palavras jogadas nesta página escura, colorida com tinta de afeição, carregadas de ansiedade e frustração.
Ansiedade porque é o meu estado permanente. Frustração que é uma vivência de mim.
Estou extenuado de me acobardar dentro de quatro paredes, do corte das minhas asas, de morrer, simplesmente, quando tudo estiver acabado e eu nem sei o que tenho para acabar.
Reconheço que já não me amas. Embora julgues o contrário. O contrário de tudo.
Julgas que te amo só porque me deito contigo. És cega. Não distingues amor de intimidade e hábito?
Sabes o que é a crise dos sete anos? Nos já ladeámos três crises e vamos tentar ludibriar a quarta.
Ambos sabemos que quando o frio na barriga passa e o príncipe encantado se transforma num simples mortal a sensação de desgaste generalizado acaba por colocar o relacionamento nos pratos de uma simples balança.
Chegou o ponto em que nada mais existe para acrescentar um ao outro e a relação passa por nós preenchendo um tempo oco.
Mas amei…
Ainda te desejo porque te amei. Amei-te e criei em mim a ilusão que podia criar em ti o amor como se o amor se plantasse como quem planta uma orquídea selvagem e a vê crescer.
Mas o amor não é uma planta.
Também eu confundi. Misturei a realidade com os meus desejos.
Queria sentir a tua presença mesmo na tua ausência. Desejava que fizesses parte de mim e que nada conseguisse expulsar-te. Queria sentir o teu cheiro e o teu corpo em tudo o que tocasse, como se, na ponta dos meus dedos, estivesse sempre o veludo da tua pele.
Detesto o sangue das feridas que deixaste abertas e que eu lambo para te sentir.
Elas são o teu rasto, a tua obra, o sinal da tua presença, a tua modificação do meu sentir, do meu ser.
Odeio a tua ausência, em cada recanto da casa, no frio dos lençóis, na mesa que não enfeitas.
Abomino a florista a quem já não compro flores, porque não há ninguém a quem as oferecer.
Antipatizo com a figura das outras que me olham e se parecem contigo.
Amargam os cigarros que fumo para matar o tempo infinito em que não existes, e não sei se são os cigarros que me vão matando se é a tua lembrança.
Enjoo o cheiro do perfume Paris que te ofereci e que nunca desapareceu deste quarto onde os nossos corpos se abraçavam, se comprimiam, se misturavam, no tempo em que ambos julgávamos que sexo era amor.
Não quero lembrar-me de ti e não consigo esquecer-te.
Odeio-te porque talvez ainda te ame!